A Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Mesão Frio completou este ano 87 anos de existência e são muitas as lutas, a superação e as histórias que fazem a história da corporação.
Pedro Poças é o comandante dos cerca de 60 operacionais no corpo ativo, mais 20 infantes e cadetes e 20 bombeiros no quadro de honra, mas gosta de se colocar lado a lado com os “seus homens e mulheres”, quer no bom, quer nas dificuldades, “que não são poucas”, disse ao nossoterritório.pt.
Dificuldades inerentes às corporações do interior do país, com cada vez menos voluntários e onde a capacidade de socorrer a população é limitada, garante.
“Andamos a tentar fazer das tripas coração, em conjugação com a direção, para termos mais meios, para termos tudo aquilo que necessitámos”, disse Pedro Poças, dando como exemplo a lacuna nas ambulâncias de socorro.
“Neste momento, temos duas ambulâncias de socorro, uma do INEM, que será cedida a este corpo de bombeiros, mas tem 600 mil quilómetros e 16 anos. A cada três/quatro serviços está a ficar na oficina. Começamos a trabalhar junto com a direção, porque era uma necessidade urgente adquirir uma nova ambulância de socorro. E foi após muito trabalho, muita luta, que conseguimos concretizar o desejo e estamos, neste momento, à espera da referida ambulância”, contou o comandante, que relata a falta de material, mas também de um veículo de combate a incêndios urbanos e um de combate a incêndios florestais.
Na designada época de incêndios, que está a decorrer, a corporação da Porta do Douro conseguiu constituir três Equipas de Combate a Incêndios e uma Equipa Logística de Apoio ao Combate, tendo diariamente no quartel 17 operacionais que, à data da nossa reportagem, combatiam incêndios em Ponte da Barca, Santa Marinha do Zêzere e Cinfães.
“Devemos ser das corporações que mais disponibilidade tem dado ao dispositivo de combate da região”, constatou Pedro Poças, evidenciando, por outro lado, que “esta disponibilidade exige, por parte do comando e da direção, mas sobretudo dos bombeiros, muito esforço, muita dedicação.
“Por isso, a minha palavra de total apreço vai para eles, porque nós sem eles, e sem a vontade deles, e sem este amor à camisola que existe nesta casa, isto não iria para a frente”, frisou.
Um amor à camisola e uma disponibilidade que não impede que haja falta de voluntários e o apelo a que se inscrevam nas escolinhas da corporação é sempre atual e pertinente.
A corporação tem uma Equipa de Intervenção Permanente, suportada pela Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e pela Câmara Municipal de Mesão Frio, que forma os 20 assalariados da instituição.
Pedro Poças defende a profissionalização como o caminho a seguir pelos bombeiros voluntários, lembrando que a EIP que tem disponível “assegura o socorro durante a semana, das 10:00 às 19:00, mas os bombeiros funcionam 24 sobre 24 horas”.
“Com o esforço dos outros funcionários e dos voluntários vamos mantendo a prontidão e estamos sempre prontos a socorrer”, garantiu o comandante, que não escondeu a preocupação com o transporte de doentes.
“Na nossa interioridade e na nossa realidade, porque não temos transportes públicos e as distâncias aos hospitais são gigantes, a única solução é, muitas vezes, os bombeiros”, salientou Pedro Poças, salientando que “a corporação não tem capacidade de responder a todas as solicitações de transporte de doentes não urgentes”.
“Apesar de termos alguns veículos e homens dedicados a isto, não temos capacidade, e é difícil explicar à população que, às vezes, não conseguimos transportar mais ninguém, porque as pessoas, no que toca à saúde e ao socorro, são muito sensíveis, elas necessitam naquela hora e é naquela hora que precisam de nós”, sublinhou.
Com o hospital de referência de uma distância de 50 minutos, em caso de doentes não urgentes, os Bombeiros de Mesão Frio falam em serviços que chegam a demorar três a quatro horas, quando se trata do socorro.
“Entre o socorro à vítima ou às vítimas, a deslocação ao hospital, a triagem e depois a espera por materiais nossos, podem chegar mesmo às cinco horas de espera, e são horas que temos uma equipa que nos faz falta para outras ocorrências”, disse o comandante, evidenciando a “importância de uma terceira ambulância para a corporação”.
Associados e Câmara Municipal de Mesão Frio são “imprescindíveis” para a sustentabilidade da corporação
Manuel Mesquita Macedo é o presidente da direção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Mesão Frio e não esconde a vontade de “dar mais à corporação”, mas os valores “são altos para concretizar sonhos, como os que o comandante falou, dos dois veículos pesados”.
As quotas dos associados ajudam, embora tenham um valor baixo, mas a autarquia que mais tem ajudado os bombeiros.
“O reconhecimento tem de ser feito. O município tem-nos suportado muita coisa, porque se assim não fosse, nós não tínhamos muito”, garante o dirigente, acrescentando que “a ajuda do município surge, sobretudo, porque está ciente de que o apoio e o socorro das populações estão a ser suportados por este corpo de bombeiros e o município é sensível a isso”.
Manuel Mesquita Macedo acredita que um novo modelo para as associações humanitárias “resolveria muitas das dificuldades”. “um modelo assente no atual modelo dos bombeiros sapadores, com ligação ao Governo central”, defendeu.
Em Mesão Frio, a autarquia lançou programas de incentivo ao voluntariado, com benefícios para bombeiros e famílias. É nas famílias que o presidente dos bombeiros pensa muitas vezes, “pelo sacrifício que fazem, pelas horas que ficam sem os seus ente-queridos”.
Cientes de todos os sacrifícios, mas também do bem que os bombeiros podem trazer a uma comunidade, a corporação de Mesão Frio tem sempre o quartel aberto à população. Participa em vários eventos, como forma de angariar fundos, mas também para proporcionar “bons momentos” à comunidade, como acontece com a tradicional festa de Santo António.
“A festa de Santo António não nos dá lucro, mas é uma forma de oferecer às pessoas alguma animação e de abrirmos portas à comunidade, porque nesse dia as viaturas vão para fora e as pessoas jantam no interior do quartel”, explicou Manuel Mesquita Macedo.
No meio das adversidades e da luta constante por um quartel melhor, mais equipado e dotado, quer para os operacionais, quer para a população, surgem histórias que ficarão, para sempre, na história dos Bombeiros Voluntários de Mesão Frio.
Adotado pela corporação, Dodge é hoje o melhor amigo dos bombeiros e fiel companheiro da comunidade mesão-friense
O socorro vai muito além das pessoas e dos bens e foi um socorro especial, efetuado há cerca de três anos, que dotou o quartel de mais um elemento, que vive nas instalações e anima nos momentos mais difíceis.
O doce Dodge, que não é um carro, mas foi no carro mais simbólico dos bombeiros que o seu nome foi inspirado, foi adotado pela corporação depois de resgatado de um aqueduto, ainda cachorrinho.
“Os operacionais tiveram de entrar no aqueduto para retirar o cão, que se perdeu da mãe e dos irmãos”, recorda Pedro Poças. Foi no quartel que recebeu os primeiros tratamentos, com comida é água e nunca mais de lá saiu. Sai, quando está aborrecido, em passeios pela vila de Mesão Frio, com o objetivo bem delineado: os talhos da localidade.
Pedro Poças classifica-o como “um bichinho adorável, que faz parte da corporação” e Manuel Mesquita Macedo diz que “ele é um malandrão, que só come e dorme”, mas o amor ao cão é bem visível nos olhos do comandante e do presidente.
No dia da nossa reportagem, Dodge não quis nada com a jornalista e não foi fácil encontrar o cão que, por vezes expulsa os bombeiros das suas camas para o seu descanso ou se esconde na fresca de um dos espaços do quartel.
Doce para as crianças, que o visitam muitas vezes, ao primeiro alerta para a saída de uma ambulância, e se estiver a porta aberta, é o primeiro a saltar para o banco.
Os operacionais de Mesão Frio sabem bem as manhas do colega canino e não arrancam sem verificar se o aspirante a bombeiro está na viatura. Na vila, todos o conhecem e não são raras as vezes que o vão buscar, à noite, para um passeio.



