Em Portugal, falar de territórios do interior como sinónimo de áreas rurais é consideravelmente impreciso, uma vez que existem áreas rurais a poucos quilómetros do “litoral”. Ao mesmo tempo, falar de “interior” como sinónimo de subdesenvolvimento é também bastante incorreto, e basta olhar para a região de Madrid no centro da Península Ibérica, para se perceber que “interioridade” pode também ser sinónimo de desenvolvimento.
Nos territórios rurais portugueses as dinâmicas não são todas iguais e simétricas, uma vez que dependem fortemente de diversos fatores: das políticas locais, do financiamento comunitário (exemplo: FEDER, FSE e Fundo de Coesão), da proximidade a centros urbanos, e de infraestruturas e das redes de transporte, etc. É, no presente, muito relevante perceber e mapear as dinâmicas sociais atuais e aproveitá-las em favor de um maior equilíbrio social e económico do território nacional.
Com os grandes centros urbanos a enfrentarem uma profunda crise de habitação e um intenso fluxo de imigração, existem já muitas pessoas a procurarem alternativa no “interior” de Portugal. E é sobretudo para cidades mais pequenas (o caso de Penafiel, Paredes, Marco de Canaveses e Amarante) que estas pessoas se deslocam. Como tal, existem no presente dinâmicas pendulares consideráveis para a Área Metropolitana do Porto. Mas, como recentemente noticiado pelo Jornal Público também outras cidades e vilas do interior são cada vez mais atrativas para os imigrantes, uma vez que para além de uma melhor qualidade de vida oferecem também preços mais baixos para a habitação (venda ou arrendamento), mas também boas infraestruturas (escolas, supermercados, etc.). É aqui que o marketing territorial deve apostar, não só numa ideia de marca turística, mas sim numa marca territorial que promova um território atrativo para viver e investir. Um bom slogan para os tempos que correm certamente será: “Viver no Interior é consideravelmente mais barato!”.
Esta diluição populacional pelo território é muito positiva, mas não tenho a certeza se os instrumentos de gestão do território (a distintas escalas) estão devidamente preparados para estas novas dinâmicas, assim como para o fluxo de imigrantes que também vem alterar algumas dinâmicas de distribuição populacional pelo território (sobretudo em municípios mais rurais). Se em alguns locais a aposta em políticas de promoção da microescala tem se demonstrado uma opção claramente errada, é certo que as cidades médias e as cidades de pequena dimensão têm ajudado a estruturar e a suportar a organização do nosso território, e, sem elas, algumas vilas estariam hoje completamente esvaziadas. Torna-se evidente que uma centralidade equilibrada é essencial e imperativa para um território mais coeso.
Parece, então, ser clara a urgência de aplicação de políticas integradas para os territórios do interior, que dinamizem as suas mais-valias e promovam uma economia sustentável. Ao mesmo tempo, é necessário que os instrumentos de gestão territorial sejam flexíveis e adaptativos, mais próximos das alterações e dinâmicas que os territórios vão sofrendo. No futuro, é imperativo perceber o impacto que as políticas públicas podem ter especificamente nos espaços rurais. Recentemente, tem-se falado no rural proofing, que é um mecanismo que analisa o impacto positivo ou negativo que a aplicação de futuras políticas possui nestes espaços, mas que em Portugal apenas a associação Rural Move o tem defendido. Parece-me que, para além desta avaliação, também a monitorização e o impacto das políticas locais devem ser alvo de avaliação, pois só assim se garante, no futuro, uma maior eficácia e eficiência nas políticas públicas.
Ao mesmo tempo, é imperativo que os espaços do interior estejam conectados ao mundo global e digital e possuam bons acessos aos hospitais e aos serviços básicos. Neste campo, ainda há muito a fazer, pois se a aposta em autoestradas aproximou os territórios, também é verdade que muitas destas infraestruturas foram “vias verdes” para o êxodo rural. Ainda assim, é imperativo conectar os territórios, mas acompanhar estes processos de infraestruturação com fortes políticas de atração e fixação de dinâmica económica e social. Em pleno século XXI, há ainda territórios profundamente encravados e inacessíveis. A título de exemplo, veja-se o caso de Cinfães, que dista 55 minutos do Hospital Padre Américo, e Resende, que dista uma hora, mas também o sudoeste do concelho de Baião atinge distâncias-tempo semelhantes. Isto para referir a importância da ligação de Baião à Ponte da Ermida (recentemente em concurso a primeira fase) e também da ligação entre a EN321-1 e Mesquinhata. Estes projetos estruturais são essenciais e vão ter um papel importante para desencravar a sub-região do Baixo Tâmega.
A aposta na rede ferroviária deve ser também uma prioridade, e reabrir linhas é uma opção que deve ser colocada em cima da mesa. Será possível que uma cidade como Amarante continue a não ter acesso aos comboios urbanos do Porto? O investimento na conversão para via larga do troço Livração-Amarante (12 quilómetros) na Linha do Tâmega permite reduzir o tempo de viagem entre Amarante e o Porto, numa obra orçada em aproximadamente 50 milhões de euros. Basta olhar para o concelho vizinho do Marco de Canaveses e perceber o desenvolvimento que, desde 2019, a eletrificação da linha do Douro trouxe à cidade. Ao mesmo tempo, os atrasos na modernização da linha do Douro até à Régua atrasam também o desenvolvimento de Baião, Cinfães e Resende, concelhos onde a procura pelo meio ferroviário tem crescido nos últimos anos.
Parece ser clara a urgência de um compromisso nacional e a longo prazo para com o desenvolvimento equilibrado do território português, onde a discriminação positiva dos territórios do interior seja evidente e promova um desenvolvimento sustentável e efetivo. Precisamos de políticas que colmatem as necessidades locais, que atraiam investimentos e melhorem a qualidade de vida das nossas populações. O “interior” não é sinónimo de isolamento ou estagnação; muito pelo contrário!
Diogo Miguel Pinto, Geógrafo e investigador